quarta-feira, 18 de novembro de 2009

O MOVIMENTO LIBERTÁRIO E A SITUAÇÃO ACTUAL
O desmoronar da chamada mitologia do“socialismo real”e as suas consequências coloca prementes questões aos libertários. Assiste-se , nesta nossa época , a uma redifinição de poderes institucionais, cujas consequências é urgente avaliar.Todos os crentes marxistas –leninistas e os seguidores das várias capelinhas dessa liturgia se sentem embaraçados e impotentes. Que fazer quando o nosse Deus perde as pernas, os braços,o coração e a sua própria cabeça, perante os nossos olhares atónitos?

O capitalismo rejubila : novas oportunidades de exploração de largos milhões de ávidos consumidores do “Leste”, o abrandamento das tensões internas , agora que os “faróis do socialismo” se apagaram,uma excelente oportunidade para recauchutar a acumulação do capital, em crise desde o início dos anos 70. A crise! A famigerada crise de que agora se fala pouco e que tem sido contida – com lucros!- graças ao “povo que pague a crise”. Os velhos, os pobres, os desempregados e as minorias de miseráveis do Terceiro mundo, do 4º mundo , do infra-mundo eternamente em “vias de desenvolvimento” , numa via cada vez mais estreita, para esses explorados e oprimidos contribuintes do consumismo do 1º mundo e de toda a corja de parasitas capitalistas das suas terras.

Enfim , a mundialização do capital torna-se ainda mais evidente após o reconhecimento do colapso do capital estatal/burocrático , que teve veleidades de partilha do globo, num
Combate à partida perdido. Só graças à manipulação do entusiasmo popular, da coerção mais violenta e de uma economia de guerra, foi possível manter durante dezenas de anos uma sociedade que se dizia sem capitalistas , mas com capital; sem patronato ou patrões institucionalizados , mas com assalariados; dita sem exploradores, mas com explorados.

O crescimento industrial , mesmo extensivo , possibilitou o acesso de largas camadas da população à instrução e um muito maior incremento de novas necessidades.Por fim nem os mais estridentes apelos às “massas” resultaram. Ansiosas por usufruírem, tal como os seus “chefes-camaradas”, os últimos gritos da tecnologia ocidental irromperam como os protagonistas da cena política. Já não lhes bastava a incúria e o absentismo, como armas tradicionais dos trabalhadores nessas sociedades burocráticas tão fechadas, baseadas em baixa produtividade e baixos salários.

Quem quiser sonhar que pague

Muito naturalmente o capitalismo sonha proclamar do alto da sede do FMI ou do Banco Mundial:“A luta de classes acabou!... Proletários de todos os países deste mundo vinde a mim consumir!”. Os senhores do mundo e seus lacaios querem aproveitar duplamente a maré favorável com rendosos negócios – o FMI , o Banco Mundial e outras prestimosas instituições avançam para o “Leste” a todo o vapor – e com a acalmia das almas – então, para quê lutar e sonhar?Vocês não vêem ao que conduzem as utopias? Ela só leva à pior das ditaduras.

Esses senhores do capital , parecem acreditar na integração completa do ser humano , na morte do sonho – quem quiser sonhar que pague! Podemos agora, dizem eles, orientar o esforço bélico para o combate à droga,um óptimo sucedâneo para o inimigo que a chaga desta sociedade necessita de enfrentar a todo o momento, a harmonia é muito perigosa – desmobiliza os espíritos e desmoraliza as Bolsas.E,como são “boas almas”,até se podem lançar, sob a batuta do hipócrita “Papa-aspirador” e outros quejandos, numa publicitada e lucrativa campanha de esmolas aos espoliados do Terceiro Mundo, mercado potencial de biliões que as contradições do capital não permitem aproveitar na globalidade.

É uma alegria ! Os povos aplaudem os “seus” sábios-governantes , impõe-se a cretinice parlamentar (ou será, para lamentar?), Éden político do sistema, os Estados e toda a sua panóplia repressiva e integradora articulam esforços –até a CIA e o KGB trocam laços e experiências...

Redefinem-se estratégias. Os Estados estabelecem entre si novas orientações necessárias à integração social e à acumulação do capital . Agora que o inimigo de ontem é o cliente de hoje,é esclarecedora a forma como se actualmente articulam as diferentes instituições que compõem o Estado moderno - Estado estrito, sindicatos, partidos, grandes empresas e os chamados órgãos de “grande informação”. Assistimos, curiosos, a diversos acordos comerciais, financeiros , socio-culturais , económicos , militares e de toda a ordem entre os Estados,à colaboração entre sindicatos,mediadores indispensáveis à integração social, e que urge desenvolver rapidamente no “Leste”, não vão as “massas” acordar, no seu afã libertador pôr em causa a “sã hierarquia democrática” . Vemos aqui também os partidos de vários matizes correrem pressurosos, e aconselhando os seus homólogos embriões de Leste.É necessário desenvolver rapidamente uma “mentalidade democrática” entre essas “massas”, ainda ontem inimigas.

No Leste novos famélicos do consumo se erguem

Os novos caminhos do “Leste” tornam-se,hoje em dia, um percurso familiar aos grandes empresários defensores do “livre mercado”, que procuram dominar - juntamente com as mafias. Há que explorar enquanto é tempo,as novas potencialidades–multidões famintas de consumo, mão-de-obra barata, ambiciosa, apta e dócil.

O capital está eufórico , as perspectivas são óptimas , porém nem tudo são rosas. Muitos perigos espreitam. Tarefas ciclópicas se impõem. E manter em “banho-maria” biliões de habitantes do Terceiro-Mundo, é bem mais difícil , agora que a informação , mesmo que distorcida, circula em instantâneo e leva, por exemplo, notícias do desperdício de alguns aos miseráveis dos quatro cantos do mundo.

É também urgente conter a ânsia de consumo e a rebeldia dos povos do “Leste” (mesmo que agora sejam membros da União (Europeia) dentro dos limites do razoável, e fazê-los aceitar rapidamente que um tão ansiado consumo tem um custo elevado – passar de uma desacreditada ficção igualitária à necessária institucionalização da desigualdade.É assim simultâneamente indispensável, manter as “massas” do “Ocidente” entretidas a “roer os ossos do consumismo”, com crescentes custos económicos e sociais e, quando a própria pressão do sistema torna mais premente a busca da liberdade.

Que fazer com estes generais?

A estes há ainda que acrescentar outros imbróligos : a acentuada destruição do planeta, que uma economia de rapina , hierárquica e necessitada de um crescimento permanente origina. O aniquilamento de vastas camadas da população , resultado do uso e abuso das várias drogas que o capitalismo forma para os inadaptados , aos que não se sentem bem neste mundo e procurem um apoio fictício , uma fuga. A morte de milhões e milhões de pobres devido ao desprezo e abandono a que são votados por um sistema em que o lucro é rei e os desgraçados são poucos rendosos.

A dificílima reconversão de enormes exércitos,agora que o inimigo se desvanece. Como arranjar empregos para milhões de desmobilizados? E tachos para os generais? E o novo “enquadramento” patriótico das “massas” ? E onde encontrar outra fonte privilegiada de lucros semelhantes à indústria armamentista ? A todas estas contradições , não é de mais acrescentar aquelas advenientes dos conflitos inter-Estados, das suas empresas, dos seus mercados. Perante este panorama,alguns arautos proclamam o fim da histeria,o início de uma era dourada de exploração , sem atritos. No entanto, um corrosivo bichinho perfura galerias e abre , buraco aqui buraco ali , abre cada vez mais orifícios por onde emerge a liberdade. Ei-la que se impõe, faz sentir a sua necessidade, mais forte do que nunca.

Eis o perigo – o Apelo da liberdade!

Aqui está o perigo, o inimigo, a subversão da ordem estabelecida –o apelo da liberdade! Liberdade que os políticos tanto nos prometem para tanto no-la limitarem – e reduzida a mera liberdade condicional.

Entretanto as várias correntes políticas e partidárias, procuram retirar dividendos destes acontecimentos. Só os comunistas estalinistas, mudam rapidamente de casaca, ou ficam paralíticos, aguardando ordens , conforme obediente costume de muitos anos, ou ainda, desorientados, põem-se em debandada.

Os sociais-democratas,os conservadores,os liberais e todos os demais,extraem do que se passa uma conclusão semelhante: as suas teses estão certas,o “Leste” confirma-o. Dêem -lhes o poder e eles nos conduzirão ao Nirvana . Com maior ou menor intervencionismo do Estado,a sua bondade incontestável, prometem-nos a vida que sonhamos se dermos a vida que eles anseiam. Conversa velha com roupagens novas...

Para os não crentes nas virtudes destes beneméritos, o Estado e o Capital, sempre como generosos,apontam-lhes os outros caminhos: refugiem-se em casa ou numa das diversas religiões pronto-a-consumir. Da droga ao consumismo,do álcool ao Deus todo poderoso que ninguém sabe onde está. Aos mais jovens e inocentes , além destas , oferecem ainda outras oportunidades: a luta pelo primeiro emprego, o combate pelo acesso ao ensino,ou ainda, a sarrafada ao serviço dos ídolos desportivos ou das seitas élitistas fascizantes.

No meio da vigarice uma luz cintilante – o Ideal Libertário

No meio da falcatrua, do embuste, da vigarice e da mentira vivida , sente-se vivamente a necessidade de termos relações sociais e políticas baseadas em princípios éticos.Nós não encontramos aqui melhores princípios, do que aqueles que preconizam a total libertação do ser humano, a assumpção plena de todas as suas potencialidades , possível através da abolição do salariato e do Estado , sem tutores de qualquer espécie, e preconizando uma sociedade baseada na liberdade e na solidariedade , no respeito do indivíduo , onde cada um produza segundo as suas possibilidades , e cada um receba segundo as suas próprias necessidades . Na organização autónoma e espontânea, criada amiúde para a solução de problemas concretos do quotidiano das pessoas, que o Estado jamais resolve, vê-se bem quão enraízados estão esses princípios.

Hoje em dia, apesar dos múltiplos obstáculos e contradições , o clima de distensão a que se assiste é favorável à difusão das ideias de liberdade . Além disso os estrangulamentos que esta sociedade cria só poderão ser solucionados num mundo radicalmente diferente.
Assim, só uma sociedade descentralizada poderá atingir a harmonia ecológica, em que o homem seja parte integrante embora distinto da natureza, seu usufruidor, mas não como depredador. Também a valorização das diferenças entre os povos da terra, o fomento da sua harmonia , a riqueza da diversidade dentro da unidade , só será possível de alcançar numa sociedade solidária, baseada no respeito das diversas identidades.

Igualmente o consumismo só será banido por uma sociedade consciente que tenha como objectivo principal a“humanização do homem”e não a sua brutalização como objecto de produção, consumo e escravidão , uma sociedade em que a “mola real” seja a realização de cada um e de todos nós (hoje prisioneiros do ego). Da mesma forma , as capacidades científicas e técnicas só serão factores de realização dos homens em uma sociedade sem exploradores, nem tiranos de qualquer espécie , onde a afirmação das potencialidades de cada um seja o objectivo de todos. E a liberdade , que nós tanto apregoamos e tão pouco se usufrui ? Somente numa sociedade sem Estado nem Capital , onde cada um seja mais livre quanto mais os outros o forem a liberdade será plenamente atingida.

Cercam-nos e asfixiam-nos

Estes e outros objectivos, hoje tão prementes, face aos cercos que nos asfixiam, só serão atingidos numa sociedade libertária. Temos o privilégio de viver numa época em que as ideias libertárias irão ser descobertas e enriquecidas por grandes multidões que anseiam encontrar as respostas para os desapontamentos e estrangulamentos de que são vítimas. O controlo social , cada vez mais apertado , não origina só “massas” abúlicas . Ele gera também a rebeldia, a ânsia pela liberdade!

As ideias libertárias, fruto de avanços e recuos de tantas gerações,consubstanciam o que de mais elevado tem o homem . Irão agora ser novamente “descobertas e enriquecidas” com a chegada de novos interessados. Compete aos libertários caminhar fraternalmente ao encontro daqueles que buscam novos caminhos. É essencial debater e difundir ideias, assumindo coerentemente o quotidiano. O ideal libertário,reserva moral da humanidade, irá fornecer, estamos certos, o devido contributo às transformações que tantos anseiam.

(trabalho do camarada J.L.Fernandes)

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